Sunday 6 September 2009

carta a deus

Londres, 6 de setembro de 2009



Caro Senhor ou Senhora,


Não sei se as informações que me foram dadas a seu respeito merecem crédito. A maioria dos seus seguidores adere a religiões que tiveram origem em Abraão: judaísmo, cristianismo e islã. A maior delas é a conhecida pelo termo geral de cristianismo, que por acaso é a que conheço melhor. Portanto a maior parte do que me foi dito a seu respeito veio direta ou indiretamente através da Bíblia, cuja primeira parte é também o livro sagrado dos judeus. Essa é primeira dúvida que gostaria de esclarecer: qual dessas religiões é a sua religião? Sua resposta poderá colocar um fim a vários problemas e conflitos, como por exemplo o impasse entre israelenses e palestinos.

Se a sua religião não for nenhuma das religiões abraâmicas, por favor responda apenas à primeira pergunta e permita-me reescrever minha carta, se não lhe for demasiado inconveniente.

Se a resposta à primeira pergunta for cristianismo, ou alguma das religiões cristãs especificamente, presumirei que o Novo Testamento deve ser tratado como uma fonte genuina de informações. Não acho que seria construtivo ater-me às discrepâncias que evidentemente há entre os quatro Evangelhos. Pessoalmente, interesso-me pela questão da virgindade de Maria. Ao que tudo indica trata-se do cumprimento de uma profecia feita no Velho Testamento, em Isaías. Porém, hoje em dia aceita-se como incontroverso o fato de que um erro de tradução do original hebreu para o grego foi cometido, e acredita-se que, devido a isso, discípulos futuros de fala grega incluiram no Novo Testamento o conceito que ficou conhecido como concepção imaculada, para que a profecia fosse cumprida. É verdade que uma virgem deu à luz Jesus Cristo?

Outra pergunta se a resposta à minha primeira pergunta for cristianismo ou uma das religiões cristãs especificamente. (Perdôe minha dificuldade de compreender o mistério da Trindade, e como consequência referir-me a Jesus Cristo e ao(à) senhor(a) como a duas pessoas/entidades distintas.) Quando Jesus Cristo planeja voltar?

Gostaria agora de abordar uma área de grande interesse para mim e acredito que também para a maioria de seus seguidores. Dizem que o(a) senhor(a) é onipotente, onisciente e onipresente. Poderia por favor confirmar se esse é o caso? Se a resposta for não, por favor pule este parágrafo; mas se a resposta for sim, lhe peço que dê atenção à minha próxima pergunta, porque ela é muito importante. Eu poderia fazer essa pergunta em termos gerais, mas talvez um exemplo sirva para esclarecer a questão de maneira mais enfática. Pouco mais de um ano atrás chegou ao conhecimento do mundo o fato de que um homem austríaco chamado Josef Fritzl havia aprisionada sua filha de dezoito anos de idade no porão de sua casa, onde ela permaneceu vinte e cinco anos sem ver a luz do sol. Durante esse um quarto de século essa moça foi seguidamente estuprada por seu pai, de quem ela teve sete filhos (e um aborto), que também passaram anos presos num porão sem nunca sair, um deles morreu. O(A) senhor(a) é onisciente, e portanto sabia do que estava se passando, sobretudo dada sua onipresença, e o(a) senhor(a), sendo onipotente, poderia ter feito alguma coisa. Por quê deliberadamente deixou a moça sofrer? Sua resposta servirá para grandemente aumentar nosso conhecimento de sua mente. Como o(a) senhor(a) sabe, o que não falta nesse mundo é sofrimento.

Minha próxima pergunta vale para qualquer uma das três religiões monoteístas: judaísmo, cristianismo e islã. Por quê o(a) senhor(a) considera mulheres como seres inferiores e/ou como seres que merecem ser tratados como seres inferiores? Talvez Jesus Cristo não possa ser acusado de misoginia, mas pode, no mínimo, ser acusado de omissão.

Se a resposta à minha primeira pergunta for judaísmo, por que o(a) senhor(a) dá preferência aos judeus? Se sua religião é a religião judia, quem não for judeu deve considerar-se preterido pelo(a) senhor(a).

Se a resposta à minha primeira pergunta for judaísmo, por quê tanta violência, tanto derramamento de sangue e tanta inclemência no Velho Testamento? Aqueles horrores devem ser vistos como exemplos de bom comportamento ou mau comportamento?

Se a resposta à minha primeira pergunta for judaísmo, onde estava o(a) senhor(a) durante o Holocausto? Por quê não vingou-se da maneira usual?

Se a resposta à minha primeira pergunta for islã, será mesmo necessário que o mundo inteiro converta-se à sua religião e adote suas recomendações para merecermos sua aprovação?

O(A) senhor(a) considera fundamentalismo islâmico uma coisa boa? Ao que me parece fundamentalismo é a opção mais coerente para um muçulmano autêntico.

Essas são as perguntas que eu gostaria de fazer. Sei que sua agenda é cheia e que sua atenção precisa estar fixada em mais de oito bilhões de pessoas ao mesmo tempo vinte quatro horas por dia sete dias por semana. Mas, como dizem, ao(à) senhor(a) tudo é possível


Atenciosamente,

André

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